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Archive for the ‘SUBSÍDIOS’ Category

O DRAMA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

 

A imprensa noticia esta semana um desvio de recursos relativos a precatórios dos quais é devedor do Estado, e que pode chegar a vinte milhões de reais. Mais uma vez, as vítimas são o Estado e aqueles que esperam talvez há mais de vinte anos para receberem seus créditos. Alguns perderam seus imóveis para abertura de estradas; outros perderam entes queridos por força de ações policiais mal feitas; milhares estão esperando que o Estado pague o que o Poder Judiciário disse que deve ser pago.

E como a expectativa de receber os precatórios é pequena, salvo as prioridades constitucionais, aos credores desesperançados só resta a cessão, percebendo cerca de vinte por cento do seu crédito, ao passo que os compradores desses créditos – que são nada mais nada menos do que especuladores -vão ao Poder Judiciário e tentam compensar os precatórios pelo valor de face.

Infelizmente, ser credor do Estado do Rio Grande do Sul tornou-se um drama nas últimas décadas. O governo, alegando que não dispõe de recursos, não paga seus credores. Mas ainda assim cria novas empresas estatais, como a Empresa Gaúcha de Rodovias, destinada a cuidar dos pedágios, quando o DAER fazia isso muito bem, há quase vinte anos, com os pedágios comunitários.

Deixamos de renovar as concessões dos pedágios para empresas privadas, para reduzir as tarifas, mas isso a médio e longo prazo exigirá mais e mais recursos públicos, cada vez mais escassos. Na verdade, isso foi feito para captar dividendos políticos, pois o Governador do Estado precisava cumprir uma promessa de campanha. A realidade, todavia, é outra, pois a qualidade das rodovias já está diminuindo a olhos vistos. E a redução da tarifa em verdade decorreu da supressão de serviços de socorro mecânico e de ambulância, que eram prestados pelas concessionárias.

Mas era preciso criar mais cargos em comissão, pois são eles que rendem dividendos políticos, podem servir como moeda de troca junto aos partidos da base aliada, além de servir como forma de reforçar o caixa, pois ao menos o PT cobra de seus filiados que exercem cargos de confiança trinta por cento de seus vencimentos. Os outros também o fazem, ainda que em percentuais menores.

Ao contrário das pessoas comuns, que quando têm muitas dívidas, reduzem suas despesas, desfazem-se dos bens que não são imprescindíveis, etc., o Estado do Rio Grande do Sul faz o contrário: deixa de pagar as dívidas existentes, que somam, somente em precatórios, mais de seis bilhões de reais, e faz novas dívidas, sem preocupar-se com as próximas gerações.

Aliás, o Governador do Estado quer reduzir o pagamento mensal com a dívida junto à União não para quitá-la mais rapidamente, como seria de bom senso; ao contrário, quer contrair novas dívidas, para os futuros governos pagarem.

Nada é feito para reduzir despesas. Mantemos o Banrisul como um banco público, a despeito de custar ao Tesouro cerca de cinquenta milhões de reais ao mês, muito mais do que os dividendos que o banco destina ao Estado, seu maior acionista. Temos também o Badesul e ainda somos sócios do BRDE. Para quê tantos bancos estaduais?

Não podemos fazer como os outros Estados (à exceção de São Paulo, que ainda mantém um banco estadual), que privatizaram seus bancos? O Rio Grande do Sul é tão diferente dos outros que precisa de um banco público estadual? Por certo que não, até porque estão à disposição dos gaúchos, como de todos os brasileiros, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, e o BNDES.

Gastamos com servidores inativos mais de cinquenta por cento da despesa de pessoal, mais do que o dobro do segundo colocado – São Paulo – e a despeito disso não temos, como a maioria dos outros Estados, um teto próprio de remuneração para os servidores públicos, que têm como teto os subsídios dos Ministros do STF, de quase trinta mil reais.

Por isso, um servidor da Assembleia Legislativa pode ganhar mais do que um Deputado Estadual; no Executivo, pode-se ganhar mais do que o Governador do Estado; e no Poder Judiciário, pode-se ganhar mais do que um Desembargador, cujos subsídios são limitados a 90,25% de um Ministro do STF, o mesmo ocorrendo no Ministério Público e no Tribunal de Contas do Estado.

Essa situação acaba criando situações paradoxais, como no Poder Executivo, em que um servidor que serve no gabinete do Governador pode perceber mais do que o respectivo chefe. O mesmo pode ocorrer no Tribunal de Justiça, com um servidor do gabinete da respectiva Presidência podendo receber mais do que o próprio Presidente da Corte. Isso é, com a vênia dos que pensam ao contrário, inconcebível, pois por mais qualificado que seja o servidor, ele não pode receber mais do que um agente politico a quem está subordinado.

Temos, assim, milhares de subordinados que ganham mais do que o respectivo Chefe, o que seria motivo de chacota numa empresa privada, porque isso vai contra a ordem natural das coisas.

E nem se diga que essa realidade não pode ser mudada, frente ao direito adquirido. O que não pode o Poder Público é reduzir os vencimentos dos servidores. Mas pode alterar seu regime jurídico de forma a que os atuais vencimentos fiquem ao menos congelados por alguns anos. E, se implantado um teto estadual, o mesmo vai acontecer: os servidores não terão redução de seus vencimentos, que permanecerão sem reajustes por muito tempo, até que se igualem ao teto.

Não se está falando aqui de reduzir salários de servidores mal remunerados, que são a grande maioria. O que não se mostra razoável, frente à situação crítica das finanças publicas estaduais, é pagarmos a servidores – ativos e aposentados – salários de até trinta mil reais (se é que para todos o teto constitucional está sendo observado), quando os Chefes dos Poderes percebem menos do que isso.

Por fim, insistimos em não implantar no Estado a previdência complementar dos servidores, que permitiria, ao longo das décadas, que o Estado deixasse de arcar com as aposentadorias superiores ao teto do regime geral de previdência social – cerca de quatro mil reais.

Enquanto isso não for feito, continuaremos a pagar a integralidade dos proventos dos servidores aposentados, que podem chegar, como foi dito, a quase trinta mil reais.

Enfim, chama a atenção a prodigalidade com que gerimos os parcos recursos estaduais. E nada é feito, entra ano, sai ano, infelizmente.

A quem interessa que a situação não mude? Essa é a pergunta que faz a sociedade gaúcha aos homens que têm na sua mão a condução dos nossos destinos.

 

Este artigo foi publicado em forma resumida no Jornal Zero Hora do dia 28.02.2013, página 10, por limitação de espaço.

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Estamos reproduzindo o importante discurso do Presidente da AMEPA na abertura do Congresso da AMB, que acontece em Belém.
Vale a pena ler.

Excelentíssimo Senhor Vice-Presidente da República, Michel Temer, Excelentíssimo Senhor Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Des. Nelson Henrique Calandra, pessoas nas quais reverencio os componentes da mesa e demais autoridades presentes;

Colegas magistrados,

A magistratura nacional desembarca no coração da Amazônia para discutir desafios, elaborar novas ideias e traçar o panorama de transformação social do Século XXI. Talvez por ironia, a mudança de paradigmas que será traçada nos próximos dias, em que a magistratura se vê à porta do futuro, das novas tecnologias, da agilidade nas informações, precisasse voltar seus olhos à simplicidade do caboclo amazônico, do mergulho na vastidão da natureza da maior floresta tropical do mundo, banhada por um rio-mar.

Como anfitriã desse momento ímpar na história associativa, a AMEPA, desde logo, saúda todos os participantes, os quais terão a oportunidade de se encantar com as belezas naturais e arquitetônicas de Belém, prestes a completar quatrocentos anos de História, bem como, aos que aqui chegam pela primeira vez, descobrir o manancial de cultura que brota de nosso solo.

O momento é apropriado para que a magistratura brasileira reflita sobre a atual situação que atravessa diante dos dilemas que lhe foram impostos pela nova ordem constitucional de mais de duas décadas: qual visão a sociedade tem do “ser magistrado”, do cidadão por detrás de uma veste talar.

Estamos enfrentando, sem dúvida, o período de maior cobrança e exposição de todos os tempos. Os julgamentos que outrora estavam restritos a salas fechadas, ao salão dos passos perdidos, ganharam a dimensão de juízo televisionado, ao vivo, on-line, e a população se acostuma com discussões e termos jurídicos, desde o primeiro dedilhar em seus computadores de mão ao noticiário antes da novela do horário nobre.

As rodas de discussões, atualmente, continuam a tratar dos assuntos triviais, da “piada do bar ou o futebol pra aplaudir”, mas, também, hoje se discute dosimetria de pena, domínio do fato entre outras querelas.

E nessa “nova” responsabilidade atribuída ao Poder Judiciário, passamos a viver dicotomias, ora involuntárias, ora derivadas de um engessamento doloso contra a independência na arte de julgar.

Diariamente juízes são cobrados a prolatar sentenças em nome de uma celeridade fictícia, um sem número de relatórios e estabelecimento de metas que, ao invés de nos aproximar da verdadeira entrega da jurisdição, do dizer o direito, nos transforma em simples máquinas de repetição, de copiar e colar, visando a satisfação de vorazes aritméticos de plantão.

E alguns ignoram o trabalho incessante de tão somente 17.000 mil magistrados para uma demanda infinda e retida de causas, muitas delas derivadas da inércia de outros aparatos do estado, especialmente do Poder Executivo em todas as esferas da federação.

Menosprezam, por exemplo, que 26 milhões de julgados no ano de 2011 não surgiram do exercício do ócio, da leniência.

Somos cada vez mais cobrados por responsabilidades que não nos pertencem. A cada dia somos responsáveis desde “a certidão pra nascer à concessão pra sorrir”, esquecendo-se nossos críticos que não cabe ao Judiciário colocar em prática conteúdos programáticos, suprir carências que não estão ao nosso alcance.

À medida que essa visão deturpada progride, outros equívocos em nome dela se consumam: fala-se que magistrado deveria bater ponto. Deveria se sujeitar ao mesmo regime jurídico de um servidor público. Aos algozes do Poder Judiciário bastariam poucos meses de regular acompanhamento de um magistrado para a constatação da necessidade de um banco de horas e da compensação.

Para os juízes da área criminal, por exemplo, um Tribunal do Júri permitiria várias jornadas em repouso. E o que dizer dos magistrados na jurisdição eleitoral? Dias e dias de preparação para votação e apuração já justificariam um afastamento longínquo das funções.

Ao mesmo tempo em que nos comparam ao exercício funcional quase paritário a um celetista, desconhecendo todo o organograma constitucional destinado ao Poder Judicante, por outro lado sofremos, especialmente pelo Executivo Federal, a negligência da simples reposição inflacionária de nossos subsídios.

Somos servidores públicos para o trabalho, mas agentes políticos quando o assunto é a recalcitrância na concessão de direitos.

Custo a acreditar que a questão derive da ausência de recursos financeiros, como bradam os responsáveis pela distribuição orçamentária. Comumente estamos sendo instigados a indicar fontes orçamentárias. Já o fazemos diariamente nas decisões de execuções fiscais e no recolhimento de tributos nas mais variadas demandas.

E digo, Presidente Calandra, a fonte mais adequada para se operar a readequação orçamentária está no controle da corrupção, na recuperação de valores subtraídos do erário. O Poder Judiciário tem feito, diuturnamente, o combate exemplar na restituição de tais valores.

O que se vislumbra, contudo, é que a discussão não mora em recursos, mas na adoção da velha política de cooptação. Muitos querem que sejamos “companheiros”, que utilizemos o nobre juízo de valor como moeda de barganha, do toma lá, dá cá.

E, pasmem, alguns andam descobrindo a pólvora, sustentando que os armazéns de miseráveis não servem para ressocializar ninguém, que preferem à morte a cumprir pena de restrição da liberdade.

Coincidência que o assunto venha a lume depois que penas privativas de liberdade, nunca antes fixadas nesse país, tenham sido exaradas por um Supremo Tribunal Federal independente.

Há pouco mais de cinco anos, uma magistrada paraense foi massacrada indevidamente, com afastamento de suas funções, por lhe ser atribuída a responsabilidade de manter uma mulher em um cárcere inadequado.

Seria dela a missão de distribuir alojamentos entre homens e mulheres, imputáveis ou não? Certamente a resposta é negativa.

Assim como, não nos cabe decidir entre qual paciente um único leito de hospital deve ser sorteado, numa verdadeira roleta-russa pela vida nos centros médicos de todo o Brasil. Qualquer dia, algum “companheiro” doente poderá perceber que, além de presídios, também não temos escolas adequadas, estradas viáveis e casas de saúde compatíveis.

Devem saber, contudo, que ser magistrado não é cargo em comissão. Não é possível nossa demissão desmotivada, tampouco as garantias constitucionais, cláusulas pétreas, podem ser modificadas ao sabor de cores partidárias.

​Mas essas inquietações não resumem o sacerdócio da judicância. Sobrevivemos apesar disso, muito além das limitações orçamentárias e das dificuldades de seis anos suportando o galope inflacionário do mundo real.

​E mais, caros magistrados, encontros como o que aqui se inicia, servem também como um panorama de um cenário jurídico extremamente diversificado.

Quando se estabelecem metas uniformes em um país continental, ignoram-se particularidades regionais insuperáveis. Sem o risco do discurso do bairrismo, mas na condição de quem recebe convidados em casa, cabe-me destacar que o exercício da magistratura no estado do Pará é profissão de fé.

Algumas comarcas desafiam o transporte sucessivo marítimo, terrestre e aéreo. Em determinadas sedes, isoladas por quilômetros de distância, segurança pública se resume a um batalhão de cinco policiais militares. A regra constitucional da residência na sede da jurisdição se faz de maneira quase forçada, sobretudo no inverno amazônico, em que as vias são levadas pela chuva de dias seguidos.

Os familiares geralmente são deixados na Capital para que tenham acesso condigno a serviços essenciais, como consultas médicas e educação de qualidade. A sina do juiz papachibé, como são conhecidos os paraenses, é a solidão, é a provação de se viver uma vida pela metade, sem poder acompanhar os primeiros passos de seus filhos, sem usufruir do contato social pleno.

​E alguns nos chamam de “meia dúzia de vagabundos”. Por ocasião do abrupto e covarde assassinato da magistrada Patrícia Accioli, que deixava o fórum da comarca de São Gonçalo após as 22h, escrevi que a última imagem da magistrada, nas câmeras de segurança do pátio forense, permitiam ver sua toga balançando leve da certeza do dever cumprido de mais um dia. “Meus ombros suportam o mundo, e ele não pesa mais que a mão de uma criança” poderia cochichar consigo a juíza. Sua armadura de pano foi manchada de sangue minutos depois. Não consigo vê-la envolta na lama de acusações levianas contra a magistratura.

​Prossigamos a nos indignar e a mostrar que um país de todos não se faz com justiça nas mãos de poucos ou querendo nos encaixar em uma vida de subserviência de pedintes.

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